Ele vagava há dias naquele deserto gelado, era uma imensidão branca.
Foram centenas de milhas sem encontrar uma única pessoa ou animais, era
apenas ele, os vários metros de espessura de neve e algumas árvores
avistadas vez ou outra. A comida era escassa e o frio era intenso.
Durante o dia andava sem rumo para aquecer o corpo com a frágil luz
solar e durante a noite ele se abrigava das nevascas em cavernas.
Esta
era uma rotina natural para ele. No inicio fora duro viver em desertos
congelados, sozinho, mas se acostumou com o tempo. Arrumar comida num
vazio e proteger-se do frio foram lições aprendidas na marra que a vida
lhe ensinara. Ele apenas sobrevivia onde muitos preferiam morrer após um
longo tempo sem saber o porquê, talvez algo dentro de si o dizia para
viver.
Christopher era apenas uma criança de seis anos quando se
esquecera de tudo antes do fatídico dia e acordara num mundo coberto
pela neve, o mundo branco, como ele o chamou desde então. Não havia
ninguém neste mundo, era o único ser racional. Ele aprendera a caçar
animais para se alimentar, entender a natureza, seu clima, sua fauna e
como se proteger do frio e das nevascas. Mas ainda era apenas um garoto
solitário de dezesseis anos.
A primeira vez que falou com alguém
desde que perdera a memória foi quando chegou a Mithra para ouvir as
saudações e as regras do jogo. Mithra era como seu mundo, um lugar
hostil e selvagem, ele sabia o que muitos participantes não saberiam,
como se mover e sobreviver naquele lugar.
Ele apertou a pedra
vermelha em sua pulseira novamente para consultar o mapa. Segundo o
mapa, ele estaria chegando ao pé da montanha, onde a neve desapareceria
para dar lugar a uma mata conífera ou algo semelhante daquele planeta.
Ele já podia ver a diferença, o frio diminuíra, o ar estava mais denso e
fácil de respirar, a neve estava menos alta e as árvores e animais
apareciam em seu caminho com mais frequência.
Entretanto, teria
que continuar caminhando no dia seguinte, estava anoitecendo e não era
seguro andar a noite, a visibilidade era baixa, o frio maior e ainda
corria o risco de ser pego por uma nevasca. Seria mais seguro procurar
um lugar para passar a noite e retomar a caminhada ao nascer do dia
seguinte.
Enquanto ele procurava um lugar para se abrigar durante
a noite, o sol caía depressa no céu e a nevasca começava a se anunciar.
Achar uma caverna fora difícil com tantas plantas trepadeiras cobrindo
as encostas rochosas daquelas montanhas, contudo, tivera sorte de
encontrar uma antes do último raio solar. Já era noite quando ele armou
uma pequena fogueira e preparou os peixes colhidos durante as primeiras
horas do dia e algumas frutinhas para comer. Após comer, ele se preparou
para dormir.
Christopher não podia ver devido às espessas
camadas de hera que cobriam a entrada da caverna, mas podia ouvir as
intensas trovoadas do lado de fora e o estrondoso vento. Dormir com
tanto barulho era quase impossível, precisava manter-se em alerta para o
caso de algum animal aparecer, contudo, o forte barulho da nevasca
camuflaria qualquer ruído de passos de animais.
Não era apenas o
barulho que o impedia de dormir, algo naquela caverna o deixava
irrequieto, mal conseguia ficar parado em sua improvisada cama para
dormir. Ele sentia uma presença poderosa chamando-o, era difícil manter o
controle de seu corpo. Parte de si queria seguir o chamado como um
viciado que experimentou os efeitos de uma droga e a quer uma vez mais, a
outra parte, como um caçador experiente, sabia que seguir aquela
tentação poderia levá-lo a morte. Mas a tentação era forte demais, lutar
contra ela era difícil, estava preso à caverna até a nevasca passar.
Ele suava como um viciado em abstinência.
Ele estava deitado
tentando esquecer o chamado quando um vento soprou do fundo da caverna,
apagando a fogueira. O sopro perdera forças enquanto um tênue brilho se
acendeu no interior da emaranhada galeria de tuneis que compunham aquela
caverna. A luz tênue o chamava ainda mais intensamente, mas a sensação
era diferente, ele não estava mais sofrendo de abstinência por uma
presença desconhecida e não o tentava mais a seguir para o interior
daquele lugar como a misteriosa presença outrora o fizera. Aquela luz o
deixava intrigado.
Dormir naquele lugar com tudo aquilo
acontecendo seria impossível, constatou ele, então decidiu averiguar o
que estava acontecendo nos tuneis adentro da caverna. Iria investigar
com cautela e preparado para lutar se precisar.
Ele apertou um
pequeno botão em sua pulseira, perto da pedra vermelha, e uma luz branca
apareceu sobre a pedra. A luz subiu enquanto aumentava o tamanho até
chegar acima de sua cabeça e estar do tamanho dela, ela iluminava tudo o
que estava num raio de cinco metros e possuía uma forma esférica. Com
sua lanterna mágica que o acompanhava, ele prosseguiu devagar.
Ele
andou por quinze minutos sem encontrar nada no caminho além de um lago,
cuja água era cristalina, o fundo resplandecia num verde-água. O teto
da caverna naquela área era aberto, o que permitia o luar iluminar todo o
lago e criar o brilho no fundo. Graças ao luar, era possível ver todos
os peixes e espécies de plantas aquáticas. Era uma beleza de tirar o
fôlego.
Após algum tempo observando aquela paisagem encantadora,
Christopher descobrira que era o fundo do lago a misteriosa luz que vira
na entrada. Ali, perto do lago, ele se sentia mais sereno, a mente
calma e os pensamentos, junto com as aflições, desapareciam aos poucos.
Era uma sensação entorpecente e tentadora a continuar experimentando-a.
Ele
tentou manter sua mente lúcida e impedir todos os pensamentos de se
esvaírem, sabia que algo estava errado com o lago, sentia como se ele o
estivesse enfeitiçando. Sair dali era a coisa mais sábia a se fazer,
então rodeou o lago para continuar andando em frente. Conforme o
rodeava, encontrava vários ossos no chão, alguns de animais, outros de
alguma espécie humanoide.
Christopher cambaleou para longe do
lago por um longo tempo, mesmo distante, ainda sentia os efeitos dele. À
medida que se afastava, tornava-se mais fácil andar e resistir àquela
sensação, porém, ele encontrava mais ossos pelo caminho, cada ossada
mais frequente. O ar úmido levava o cheiro de morte as suas narinas.
Estranhas
inscrições começaram a aparecer nas paredes rochosas conforme seguia o
túnel. As inscrições eram antigas, assim como a língua em que elas
estavam escritas. Era uma língua morta e há muito tempo esquecida,
contudo, por algum motivo, Christopher conseguia entender o que estava
escrito.
As inscrições contavam a história de um antigo povo que viveu por muito tempo no interior da montanha.
Eles
chegaram à Mithra em sua Segunda Era, quando Mill, a Grande Deusa,
criara as várias raças humanoides racionais, esculpidas pela magia. Os
Qiwins foram os primeiros, criados à forma física humana e com algumas
habilidades que lhes diferenciavam dos humanos, habitantes naturais de
vários mundos.
Eles possuíam olhos especiais na qual
lhes davam a habilidade de enxergar mais do que olhos comuns podiam,
eles conseguiam ver as fraquezas de seus oponentes. Graças à habilidade,
ganharam o título de Grande Caçador com o passar do tempo.
Os
Qiwins também veneravam Mil como sua Deusa Protetora e, principalmente,
como sua mãe. Tratavam a Guardiã como os filhos tratam suas amadas
mães, e para Mill, eles também eram como filhos. Ela os abençoava em
suas caçadas e os protegia de qualquer mal, como qualquer mãe faria.
Durante
séculos, Mill tivera a companhia que sempre desejara, era amada por
seus filhos e nunca estava sozinha. Ela sempre tinha alguém para
conversar, alguém para rir com ela ou fazê-la rir, alguém para consolar a
tristeza de seu coração quando algum filho falecia. Durante séculos,
estivera feliz como desejara, apesar de algumas tristezas. Em gratidão a
essa felicidade, a jovem guardiã dera-lhes um poderoso artefato aos
seus filhos.
Ele concedia ao seu portador enxergar muito
além que qualquer outra raça existente poderia, ele possibilitaria o
portador a ver tudo. O artefato originalmente pertencera a um mundo
antigo, chamado Neasa, e fora replicado em Mithra. Era uma réplica
igualmente poderosa ao original.
– Neasa. – repetiu Christopher passando os dedos sobre os caracteres usados para o nome. Aquela palavra parecia-lhe familiar, já a ouvira em algum lugar, só não sabia ao certo onde.
Durante
algum tempo, os Qiwins agradeceram o presente com muitos suculentos
banquetes e construções de pequenos templos em sua homenagem. Com o
poder, tornaram-se um reino próspero e grandioso.
Contudo,
o poder do artefato se desenvolveu com as gerações. Era passada de pais
para filhos no nascimento como uma característica genética e, a cada
geração, a habilidade crescia e tornava-se mais poderosa. Um poder que
ultrapassara até as previsões de Mill.
Os Qiwins possuíam uma compatibilidade muito grande de união ao artefato, esta fora a principal causa de sua extinção.
O
que no início era um presente tornou-se uma maldição. O poder era
grande demais para ser controlado, viciante demais para ser usado,
perturbador demais para qualquer mente normal e o pior, inseparável. O
artefato unira-se de forma permanente aos Qiwins, tornando-se parte da
raça.
A evolução do poder lhes deu as habilidades de ver
o passado, presente e futuro, a verdade por trás da mentira, a
realidade ao invés da ilusão, o coração das pessoas, entre outras
coisas. A capacidade de ver tudo o que está por trás do véu de segredos
era encantadora e, ao mesmo tempo, assustadora.
Descobrir
a verdade por trás das mentiras dos outros desencadeou uma discórdia
muito grande, era pais não confiando mais em seus filhos, esposas em
seus maridos, crianças em adultos, idosos nos jovens e, principalmente,
todos passaram a temer Mill. Os Qiwins passaram a viver com medo de suas
próprias sombras e aos poucos iam enlouquecendo.
Alguns
fugiram daqueles sem sanidade que matavam aos outros sem qualquer
motivo, refugiaram-se no interior sombrio das montanhas e juraram jamais
voltar a ver a luz. Nas cavernas escuras eles encontraram abrigo e
proteção, era difícil enxergar no escuro e isto impedia de ver algumas
das coisas que o poder lhes oferecia.
Contudo, não fora o
suficiente, muitos enlouqueceram na ausência de luz e as matanças por
medo continuaram. Os Qiwins foram extintos aos poucos por seu próprio
poder e esquecidos pela Deusa com o tempo, acreditando não haver mais
salvação, ela criara outra raça que pudesse substitui-los e lhe fazer
companhia.
Esta é a decepcionante história de meu povo,
sou o último Qiwin vivo, porém, não será por mais muito tempo. Meu fim
está se aproximando, eu posso vê-lo sempre que fecho meus olhos, deixo
este aviso na antiga língua da deusa para todos que encontrar esta
caverna. Jamais toque naquela coisa, aquele artefato é amaldiçoado e irá
matá-lo com seus próprios medos, acabará insano como meus amigos, minha
família e eu acabamos.
– O olho que tudo vê, Drust. – proferiu Christopher sem pensar ao terminar de ler a penúltima frase da inscrição.
Drust, o olho que tudo vê, é um poder acima da compreensão e controle de todos, pegue o que quiser, mas fique longe dele.
De
alguma forma, Christopher conhecia vagamente Drust. Era estranha a
sensação que aquela palavra lhe causava, sentia como se aquilo remetesse
ao seu passado, mas ele não conseguia lembrar o que, perdera a memória
quando ainda era bem pequeno. Ele queria lembrar-se de seu passado, ler
aquela palavra lhe causava esse desejo, queria recuperar o que um dia
lhe pertencera e ele perdera. Mas aquela não era a hora, nenhuma
tentativa de lembrar funcionava.
Enquanto tentava lembrar, ele se
deu conta de que a inscrição terminava no limiar de uma antiga aldeia
Qiwin, ou o que sobrara dela. Christopher entrou na aldeia caminhando
devagar, sua lanterna mágica assustara hordas de morcegos que fizeram
daquele lugar seu lugar de descanso.
À medida que entrava na
antiga aldeia, via que as paredes de pedra talhada das casas estavam
desgastadas pelo tempo, algumas casas tiveram seus telhados de palha
quebrados e o interior das casas, vistas pelas janelas, estavam uma
bagunça. Aquele lugar era ruínas muito bem preservadas da antiga aldeia.
A
aldeia era formada por dois corredores que levavam até uma construção
maior do que as casas normais. A construção maior parecia uma espécie de
um antigo templo completamente destruído. Grandes blocos de pedra que
uma vez constituíram a parede do templo agora estavam despedaçados no
chão.
Apenas uma coisa ainda estava intacta naquele santuário,
era uma espécie de pedestal no qual Christopher não sabia dizer o que
estava nele. Ele pegou o que estava no pedestal para observar de perto,
parecia uma pedra completamente esférica do tamanho de um globo ocular,
depois pôs no lugar novamente.
– Que coisa estranha. – pensou em
voz alta então se virou para observar a cidade da vista do santuário –
Estranha como tudo neste lugar. Essas casas estão intactas demais para
uma ruína de milhares de anos e este templo...
Quando se virou
para olhar o pedestal e as paredes da construção novamente, fora
surpreendido com um brilho singelo. A pedra esférica flutuava alguns
centímetros acima da superfície do pedestal enquanto brilhava
intensamente. Ela emanava um calor reconfortante, não estava quente nem
frio, enquanto prendia a total atenção de Christopher.
Aquela luz
o encantava, não conseguia resistir à tentação de não olhar. Ela
chamava por seu nome e induzia uma sensação de torpor, enfeitiçando-o.
Enquanto olhava para ela, o resto do mundo não parecia existir, ele não
ouvia nada, não sentia nada e não via mais nada além daquele brilho
caloroso. Então o brilho se apagou e, junto com ele, a pedra
desaparecera, deixando-o sozinho na caverna escura e fria.
Seu
devaneio enquanto fitava o vazio foi quebrado por um ruído vindo de suas
costas. Não percebera o que acontecera ao seu redor enquanto estava no
torpor induzido pela pedra, os ossos espalhados pelo recinto se
reergueram em forma de esqueletos de várias pessoas que andavam em sua
direção.
Ele piscou os olhos, incrédulo, com o que via. Em um de
seus olhos, ele via a ruína de uma antiga aldeia quase intacta, do mesmo
jeito como vira quando chegara naquele lugar. Com o outro olho, via a
aldeia completamente destruída, igual ao templo, e com esqueletos
andando em sua direção, alguns seguravam facas e espadas. O andar dos
esqueletos eram lento, mas eles nunca paravam de andar, quando
tropeçavam e se desmontavam, eles se remontavam e voltavam a andar.
– Drust... – sua voz saíra fraca e horrorizada.
Christopher
estava horrorizado e, pela primeira vez, sentia medo, o que quer que
fosse aquilo não haveria como pará-los. Ele deu um passo para trás,
esbarrando no pequeno pedestal, este caiu no chão e se esfarelara,
deixando apenas o pó de pedra. Ele recuava aos poucos, de passo em
passo.
Ouviu um ruído de suas costas, era um barulho de alguma
coisa riscando a pedra. Ao se virar para ver o que era, viu um aviso na
parede da caverna, uma segunda inscrição.
Eu lhe avisei para não tocar naquela coisa, agora sofrerá as consequências. Não poderá mais sair destas paredes!
A
inscrição era recente, fora feita naquele mesmo instante. Se
Christopher não tivesse visto com os próprios olhos enquanto era
escrita, ele provavelmente não iria acreditar. A alma do homem que
escrevera o aviso o encarava com fúria, Christopher conseguia vê-lo com o
olho direito enquanto o com o esquerdo, não via ninguém.
Ele
olhou os esqueletos mais uma vez, estavam mais pertos e se aproximando
cada vez mais enquanto ele ficava parado pelo medo. Depois olhou o homem
novamente e percebeu que sua vida correria perigo se continuasse ali,
seria morto pelos esqueletos para devolver Drust ao seu templo.
Christopher
retirou as adagas de seu alforje, preso em sua cintura, e começou a
correr. Entrou no primeiro túnel que viu e correu, precisava sair dali
se quisesse viver. Ele encontrou alguns esqueletos pela frente que
precisou atrasá-los com as adagas, ele cortou alguns ossos,
desmontando-os, enquanto corria.
– Onde está a água quando preciso?
Ao
fim do túnel escolhido, ele se deparou com uma saleta com quatro
caminhos diferentes, contando com a de onde havia vindo. No caminho a
sua frente, mais esqueletos vinham ao encontro dele; atrás, tinha os que
o seguiram até lá; em sua direita, havia outros; e a sua esquerda, uma
horda de esqueletos. Ele estava cercado, havia esqueletos por todos os
lados.
– Isso parece um pesadelo! – resmungou em voz alta.
O pesadelo que você escolhera, uma voz ecoara pelos túneis em resposta a ele.
– O que você quer de mim? – gritou.
Drust deve permanecer dentro dessas paredes, repetiu a voz.
Um
esqueleto surgira atrás dele e tentara matá-lo, encravara uma faca em
seu braço. Ele percebera o esqueleto no último segundo, tivera sorte de
conseguir desviar o suficiente para proteger seus órgãos internos, o
verdadeiro alvo.
Ele retirou a faca de seu braço e apunhalara o
esqueleto em uma de suas cavidades oculares. A princípio, a ideia
parecera ridícula, o esqueleto recuara alguns passos atordoado, mas
depois voltou ao normal. Entretanto, quando o esqueleto retirara a faca
do lugar onde estivera um de seus olhos, ele se desmontou, voltando a
ser apenas ossos inofensivos.
Aquilo lhe dera uma ideia, se eles
voltavam a ser apenas ossos quando apunhalados em uma das cavidades
oculares, então nem tudo estaria perdido, mas ainda teria que fugir
dali, não poderia lutar com tantos esqueletos.
Ele seguiu o
caminho da direita, onde tinha poucos esqueletos ambulantes. Arremessara
a faca com seu sangue onde esteve o olho de um deles enquanto corria
segurando a adaga em sua mão esquerda. A outra estava guardada no
alforje, o braço direito estava ferido demais para manejar uma adaga.
Escorria muito sangue do ferimento profundo, a faca trespassara o
músculo de um dos lados e abrira um ferimento até o osso, por sorte o
osso estava intacto, mas o músculo estava dilacerado. O ferimento se
regenerava aos poucos, fizera bem ele escolher regeneração rápida como
uma de suas habilidades.
O túnel da direita era longo, mas não
havia ramificações em seu decorrer, o que era bom, pois não apareceriam
mais esqueletos em cantos onde ele não consiga ver. O cheiro ali também
era agradável, uma mistura do ar úmido e mofado, preso em um lugar
fechado, com a umidade da neve, a terra e flores do exterior da
montanha. O aroma era sinal de que estava se aproximando da saída, ele
já conseguia ver alguns feixes de luz no final do túnel.
À medida
que corria, a luz ficava mais intensa e o cheiro menos mofado. Suas
pernas estavam cansadas de tanto correr, podia sentir os músculos de
suas pernas se distendendo com seu esforço excessivo. Era questão de
vida ou morte, precisava sair dali.
Quando finalmente alcançou o
exterior da caverna, a luz do sol da manhã o cegara, estivera à noite
inteira em uma caverna escura com o pouco de iluminação de sua lanterna.
As pupilas demoraram a se acostumar com tanta claridade, quando voltou a
enxergar alguma coisa, viu que estava em um penhasco. Aquele túnel
levava para uma passagem do outro lado da montanha, onde, em baixo,
corria um grande rio.
Ele se virou para ver onde estavam os
esqueletos e viu que eles estavam parados no limiar da entrada da
caverna. Eles brigavam entre si, mexiam seus maxilares como se tentasse
dizer algo, mas nenhuma voz saia, e esticavam seus braços tentando pegar
Christopher sem sair da sombra da caverna.
O jovem caçador ouviu
uma explosão e um clarão surgiu, estava novamente com os olhos
ofuscados com tanta incidência de luz. Os pássaros de toda a floresta
gelada voavam para longe, assustados, eles grunhiam enquanto um pilar
enorme de uma luz azulada se estendida da montanha até o céu, vista
apenas com o olho direito. Várias almas subiam aos céus enquanto os
esqueletos no interior da caverna voltavam a ser somente ossos de
pessoas que morreram há muito tempo.
Quando o pilar se apagou,
levando todas aquelas almas embora, Christopher deixara se jogar no
chão, exausto e aliviado, os esqueletos eram um problema a menos a que
se preocupar. Sentado na encosta do rochedo, a dor em seu braço ferido
começava, era intensa. Ele sentia como se seu braço tivesse sido partido
ao meio, queria gritar de dor, mas a voz não saía e o braço ficava
imóvel. A dor e o cansaço eram tantos que ele acabou dormindo, ali
mesmo.
Em alguma parte de Mithra, uma mulher de aparência jovial
assistia às almas partindo sentada em um dos galhos de uma árvore
gigante. O cabelo castanho estava solto em suas costas e seus olhos
vermelhos com as pupilas em forma de prismas negros observavam ao
espetáculo com atenção.
– A maldição dos Qiwins foi quebrada. Agora que o artefato foi retirado de sua aldeia, suas almas poderão descansar em paz.
Adorei! :3
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